domingo, maio 25, 2008

Gritar


Não me podem impedir tão singelo gesto,
em alto e bom som.
Em indigestos paradigmas honestos
ou rima, ou riso, ou nexo.

Podem querer que me negue a corte,
eu nego, eu juro que nego.
Se querem que finja falsos encantos,
na cartilha deles eu rezo.
Mas não me podem impedir o desengano,
de gritar.

Eu sou, eu sou.
Se querem que diga que sou azul,
Me digam que me faço.
Eu ralo e disfarço. Engano, nu.
Mas gritando, gritando.

Quando grito, choro de raiva.
Olho torto, mordo o nada entre os dentes.
Quando grito não faço mais nada,
embora embeleze o pavão primaveril
dos jovens, dos velhos e dos ausentes.

Grito na cortina de chuva,
quando chego cedo por que mandaram,
visto linho sem ter grana para ter trapo,
quando soluço e continuo
em vez de parar e chorar.

Podem me impedir de pensar,
mas nunca de gritar, por quase tudo.
Enquanto grito não faço mais nada,
soluço entre os cantos desta sala
fechada, deste pavão primaveril.
Com um forte gosto imbecil entre os dentes
disfarço e desfaço em grito verdadeiro,
um grito insano, hipócrita e tristonho.

30/08/08 Marcos Vinicius Policarpo Côrtes
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